terça-feira, 23 de setembro de 2014

Relato do meu primeiro parto

Eu acho que é a primeira vez que eu paro pra relatar como foi o parto da Giovana. Ao longo desses 7, quase 8 anos, eu fiz de tudo para esquecê-lo. E hoje, sentada escrevendo, as emoções retornam com força total. Mas, vamos lá...
(Atenção: meu relato de parto não é bonitinho e eu não quero assustar ninguém. Cada parto é um parto. E o MEU foi assim !! )

Eu engravidei da Giovana aos 19 anos. Namorava o Mursael há 10 meses. Tínhamos planos de nos casarmos, mas não tão em breve. Queríamos planejar noivado, casamento e lua-de-mel. Porém no dia 19 de Maio de 2006 tivemos a maior notícia das nossas vidas: seríamos pais.
Eu estava no corredor do Hospital Santa Marina, hoje fechado. Com o resultado em uma mão, a outra mão na boca e, de repente, eu só me lembro de ter sido amparada pelo Mursael e um enfermeiro. Eu desmaiei.
Só me vinha a imagem do meu pai na mente. Como contar aquilo pra ele? 

Fui pra casa me arrastando. Um trajeto de meia hora, fiz em duas horas pra que eu já os encontrasse dormindo. Subi pro meu quarto e, naquela noite, coloquei a mão na barriga e pensei: Tem alguém aqui !
Contar pros meus pais não foi tão ruim. Eles me apoiaram e aceitaram.

O Mursael começou a construir a nossa casa para que ela ficasse pronta antes do bebê nascer. 
A gestação não foi fácil. Tive descolamento de placenta logo no início. Tomei muitos remédios e precisei faltar no trabalho várias vezes.
O fato de ser muito jovem, não ter uma estrutura financeira, a imaturidade, tudo contribuiu para uma gestação atribulada. 
Fiquei internada muitas vezes pois do sexto mês em diante (diziam os médicos) a Giovana queria nascer. Então, fiquei internada muitas vezes para "segurá-la" por mais tempo.

Naquela época, qualquer dorzinha que eu sentia, corria pro médico. E eles, sem hesitar, me internavam. Hoje, mesmo não entendendo muito sobre, vejo que isso era um exagero, pois sinto as mesmas dores nessa gestação e estou numa boa.
Cada internação eu saía pior. Mais inchada, mais cansada e com mais medo.
Eu nem queria pensar em parto. Eu não me informei sobre absolutamente nada.
As histórias que eu ouvia eram terríveis. E esse era um assunto que eu definitivamente não queria saber. Eu não era protagonista da minha própria gestação.

No dia 29 de Dezembro de 2006, eu fui para a maternidade. Cheguei lá com algumas dores. A gestação ainda não havia chegado nas 37 semanas. Passei com o médico de plantão que disse que teríamos que fazer uma cesariana de emergência. Por que? Nem eu sei.
Ele me fez uma série de perguntas. Perguntou se eu sentia minha calcinha molhada. Eu disse que sim, mas que não sabia se era urina ou líquido e ele disse que não ia esperar pra descobrirmos e me internou.
Fiquei internada por mais de 18 horas. Fiquei no pré-parto junto com outras gestantes. 
Ninguém vinha me dar nenhuma informação. Apenas veio uma enfermeira e colocou um soro. Perguntei o que continha no soro e ela apenas disse: "É um sorinho, mãezinha !"
5 minutos depois do soro na veia, comecei a sentir uma coceira horrível no corpo inteiro. E, pra minha surpresa, a gestante na maca ao lado começou a se coçar inteira também.
Entramos em desespero e chamamos a enfermeira. Essa apenas "desligou" o soro e saiu da sala.
Estávamos ao Deus dará. Meu marido não podia ficar comigo. Eu não tinha com quem contar. O medo foi me invadindo.
Então, trocou o plantão. Nesse momento, um anjo do Senhor enviou um médico chamado Lincoln que sentou na minha cama e começou a conversar comigo. Perguntou porque eu estava ali. Contei todo o absurdo que tinha acontecido.
Ele então pediu uma ultrassonografia, fez um toque e voltou dizendo: "Vai pra casa, meu anjo. Esse neném não vai nascer hoje não !!"
Ele balançava a cabeça, como se também estivesse indignado, mas por ética não podia me dizer nada.
Tive alta. 
Minha cabeça esta a mil.
Aquela experiência tinha sido horrível. Eu me sentia em um calabouço. 
Desse dia em diante, eu não dormi mais. 
Passava as noites em claro, com medo, pensando em como seria horrível viver aquilo novamente.

Os dias passaram e no dia 07 de Janeiro de 2007 eu acordei com uma dorzinha estranha. Minha inexperiência e imaturidade me fizeram ir correndo de novo pro hospital.
Eu relutei o dia inteiro. Mas quando vi o tampão mucoso sair, me desesperei e quis ir. Era umas 18 hs. Eu morava em Itapecerica da Serra e a maternidade ficava no Jabaquara. Não tínhamos carro. São Paulo estava alagada devido a uma enchente.
Resultado: meia noite e eu estava sentada em um cruzamento, na calçada, pois não haviam ônibus, nem táxis devido ao estado caótico da cidade.
De repente, um táxi todo apagado passa e meu marido se joga na frente. O taxista pára e logo vem me ajudar a levantar da calçada. Cheguei na maternidade 00:30 hs. 
Me colocaram no cardiotoco. O médico de plantão estava fazendo uma cesariana.
Do terceiro andar, apenas ligou pro PS e disse pra enfermeira me subir que ia fazer meu parto.
Fui conhecer o médico que fez meu parto na SALA DE PARTO !!!
Fui andando até a maca, sentei e eles me anestesiaram. 
Meu marido ainda nem tinha entrado, estava se vestindo. 
O anestesista foi muito bonzinho comigo, ele viu meu pânico e me deu a mão até meu esposo chegar.
A cesariana foi rápida. Logo vi o rostinho lindo da minha filha. Mas eu não acreditava que aquilo estava acontecendo.
Aquilo era um parto??? Era mesmo como chegar pra pedir uma pizza?
Eu estava atônita. Parecia que eu não estava ali, parecia um filme.
O parto acabou, fecharam minha barriga e levaram meu bebê aos prantos.
Meu marido teve que ir embora e eles me levaram pra uma sala onde fiquei sozinha por longas 4 horas. 
Não havia ninguém na sala. Era madrugada e nem que eu quisesse chamar alguém, ninguém me ouviria. 
De repente, comecei a sentir a mesma coceira do dia do soro. Só que pior.
Nariz, olhos, garganta, ouvidos, tudo coçava. Eu mal conseguia respirar.
Gritei e vieram me acudir.
Eu não sei como estava meu rosto, mas a enfermeira voltou com o médico e esse apenas me olhou e disse que ia aplicar um antialérgico. Sei que aplicaram na minha perna porque ele me disse. Eu não senti. Ainda estava anestesiada.
A coceira piorou. 
A enfermeira veio e me aplicaram outro antialérgico. Apaguei.
Fui acordar no dia seguinte já no quarto. Não vi minha filha por um dia inteiro.
Eu estava dopada. 
Só me lembro que vinham me dar analgésicos e mais e mais remédio toda hora.
Eu não conseguia ficar acordada e me lembro que em uma das vezes que abri os olhos vi uma médica me olhando com uma expressão assustada. 
Eu abria e fechava os olhos. Tinha apenas relances do que estava acontecendo.
Quando ouvi a voz do meu marido, fiz um esforço muito grande e consegui abrir os olhos e perguntar da nossa filha. Foi então que eu vi que ela estava no bercinho. Eu não tinha nem amamentado meu bebê.
No dia da alta foi quando eu consegui me manter acordada e tomar um banho. E amamentar a Giovana. 
A pediatra veio e disse que a Gi estava com icterícia, mas num grau moderado e que poderia ir pra casa e tomar banhos de sol diários pela manhã.
Eu queria sair daquele hospital.
Eu me esforço pra lembrar das coisas que aconteceram depois do parto, mas eu não me lembro.
Meu marido diz que eu comi. Não lembro.
Minha mãe diz que me ajudou a tomar banho. Não lembro.
Quando a médica veio me dar a alta me levantei com muita dificuldade, meu esposo e minha mãe me ajudaram a vestir e eu queria sair correndo dali.
Quem disse? Mal conseguia andar. Aquilo doía demais. 
Minha mãe foi quem saiu da maternidade com a Gi no colo. E meu marido me amparando.
Quando cheguei no térreo, pensei que minha cabeça fosse abrir em duas. Uma dor que eu não conseguia raciocinar. Parecia que havia uma bigorna na minha cabeça. Voltei pro Pronto Socorro. Mediram minha pressão. Estava normal e me liberaram.
Fui no carro, semi deitada, com a cabeça apoiada em um travesseiro. Se eu mexesse a cabeça pra olhar pra Giovana, latejava até eu ficar com a vista escura.
Chegando em casa, minha mãe colocou a Gi no carrinho e eu fiquei na cama.
Olhei pro meu marido e comecei a chorar.
Eu não entendia porque estava sentindo aquilo, mas a sensação que eu tinha era de morte. 
E a culpa de estar sentindo aquilo era enorme. Eu via um bebê lindo no berço ao mesmo tempo que meu coração estava dilacerado. 
Todos me perguntavam o que eu estava sentindo. E eu não sabia explicar.
Hoje eu sei. Eu me senti violentada. Abandonada. Abusada. 
No momento mais importante da minha vida. Eu fiquei 3 dias praticamente dopada, sem poder amamentar. Eu nem sei como foi o primeiro banho da minha filha. Resgatar esse vínculo mãe e filha com ela, foi difícil. Fomos desligadas por 72 horas.

Eu demorei 7 anos pra engravidar de novo. Houve épocas na minha vida que eu não queria engravidar nunca mais. Porque, pra mim, parto era isso. 
Mas a Palavra diz que ao conhecermos a verdade, ela nos libertará. E quando aprendemos que a verdade é que: "Não, um parto não é isso !"
Tudo muda ! 
Quando descobri a gravidez do Antônio, comecei a lutar por um parto digno. E é o que tenho feito a maior parte dos meus dias. Me munindo de informações, me empoderando. Conhecendo meus direitos.
E eu fico muito, muito, muito triste pois meninas como eu era na época sofrem isso diariamente. 
Eu oro a Deus pra que essa cultura seja quebrada. Para que tenhamos partos realmente mais humanos, naturais.
Meu sonho? Parir na sala da minha casa.
Se será possível? Não sei.
Lutaremos por um parto digno, respeitoso e que apague o primeiro. E que fique somente o momento em que amamentei minha filha pela primeira vez. Pois é a melhor lembrança desse período.

Com amor e sinceridade,

Roberta.

Nenhum comentário:

Postar um comentário